“Portugal tem de crescer 3,9% ao ano em 20 anos”, defende BRP

Fraca produtividade da economia, baixos salários, lentidão da justiça e o enorme peso da fiscalidade são algumas das conclusões da comparação de Portugal com um grupo de oito “países concorrentes”. Nova plataforma digital da BRP utiliza 30 indicadores que espelham a posição competitiva de Portugal em diversas áreas.

“Parece que normalizámos crescer apenas 1% e ficamos felizes com isso”, começou por afirmar, em tom de crítica, Vitor Ribeirinho, CEO da KPMG, na apresentação da nova plataforma digital Comparar para Crescer, lançada pela Associação Business Roundtable Portugal (BRP), em parceria com a KPMG.
“Se não nos compararmos não sabemos onde estamos, nem para onde vamos”, sublinha Vasco de Mello, presidente da BRP, entidade que reúne 40 das maiores empresas em Portugal.
As conclusões retiradas desta plataforma, que visa analisar a evolução de Portugal com outras economias e com um “peer group” constituído por Espanha, Eslovénia, Estónia, Grécia, Hungria, Itália, República Checa e Polónia, não são, de todo, animadoras.
Entre 2000 e 2022, a economia portuguesa cresceu, em média, cerca de 1% ao ano e o país gerou apenas mais 23% de riqueza acumulada, enquanto, no mesmo período, Espanha cresceu quase o dobro.
Nas últimas duas décadas, o conjunto dos oito países europeus, que em 2000 tinham um PIB per capita próximo do português, cresceu quase três vezes mais. Destes grupo de países concorrentes, apenas Itália e Grécia cresceram menos que Portugal.
Já os países concorrentes da Europa Central e do Leste apresentaram crescimentos substanciais, com destaque para os 134% da Polónia, quase seis vezes o crescimento português.

Salários com crescimento abaixo da média

Em relação à competitividade salarial os dados também são não muito promissores. Desde 2000, Portugal aumentou a remuneração média em 11 mil Euros, muito menos do que a média da União Europeia (16 mil Euros) ou dos países concorrentes (15 mil Euros).
Entre os países comparáveis, apenas 4 tinham uma remuneração média acima da portuguesa em 2000. Hoje só 2 estão abaixo.


Esta divergência em competitividade salarial face à média da UE e dos países concorrentes, aliada ao aumento do número de licenciados, é uma das razões apontadas para o problema da fuga de talento do país.
“Precisamos de garantir a retenção de talento. Não nos podemos acomodar numa situação em que 40% dos nossos licenciados vão para fora. Para isso, precisamos de crescer. Um país que não cresce, não consegue dar oportunidades”, afirma Vasco de Mello.
Para voltar a colocar Portugal no ranking dos 15 países com maior PIB per capita da União Europeia. o presidente da Associação BRP defende que “temos de crescer de forma significativa nos próximos 20 anos em relação aos nossos concorrentes. . Para isso, temos de crescer em média 3,9% ao ano. É um desafio que temos todos de abraçar.”

Equilíbrio das contas públicas, mas nível de dívida preocupa

Numa nota mais positiva, o saldo orçamental, comparando com a UE e os países concorrentes, tem tido um bom desempenho desde 2019.
Destaca-se o saldo da balança corrente , que de uma situação bastante deficitária em 2010 (défice de -10,3% do PIB) passou a uma situação mais próxima do equilíbrio: -1,1% em 2022 e projeções de cerca de +1% em 2023 e seguintes.
A saída do grupo dos cinco países mais endividados da UE e a evolução recente num sentido favorável no que toca às contas públicas não invalida que continuemos, apesar de tudo, com um rácio muito elevado de dívida pública face à média europeia e países concorrentes.
“O foco exclusivo nas ‘contas certas’ gera problemas estruturais, de que a deterioração dos serviços públicos e o aumento da desigualdade são exemplo”, conclui a análise realizada pela Associação BRP. “É essencial manter o controlo do saldo orçamental e continuara desagravar o peso da dívida, sem pôr em causa o investimento e a modernização dos serviços públicos.”

Portugal é o 2.º país mais lento na resolução de litígios administrativos

Portugal demora 847 dias para resolução de litígios administrativos em primeira instância, mais do dobro da média dos países concorrentes (372) ou de Espanha (406). É o segundo país menos eficiente dos países concorrentes, só superado pela Itália (862 dias).
Em termos de qualidade regulatória, Portugal tem vindo piorar no indicador no Banco Mundial desde 2018. No grupo de países concorrentes, apenas Itália, Hungria e Grécia têm um desempenho menos favorável.
Este é um problema já há muito diagnosticado e com consequências graves, já que a lentidão da justiça e a qualidade regulatória limitam o investimento e a produtividade do país.

Empresas pagam mais impostos e salários são mais baixos

Outro aspeto, altamente penalizador para o tecido empresarial e para a sua competitividade, são as elevadas taxas de impostos pagas pelas empresas. Mais uma vez, Portugal está muito acima da média europeia e dos países comparáveis em relação às taxas de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC).
As taxas de imposto efetivas estão também acima das dos países concorrentes, embora com menor diferença.
“A diferença entre a taxa estatutária e a efetiva reflete o nível elevado de complexidade fiscal. As empresas de menor dimensão têm dificuldade em conseguir tirar partido e as estrangeiras em compreender os benefícios”, refere a análise da Associação BRP.
Além disso, a receita de IRC está muito concentrada: as empresas com volume de negócios acima de 1 milhão de euros representam 13% das declarações com IRC liquidado (7.6% das declarações totais) mas 81.6% do imposto arrecadado (dados de 2021).
Em relação ao Tax Wedge (diferença entre o custo de um trabalhador para uma empresa e o salário líquido que o trabalhador recebe) também se verifica uma tendência de crescimento em Portugal, em oposição ao percurso dos países concorrentes, que têm apresentado um decréscimo.

Na verdade, em todas estas dimensões fiscais os países concorrentes
e UE têm registado uma tendência de desagravamento, enquanto Portugal tem uma trajetória a contraciclo, que penaliza fortemente a atratividade e competitividade do país.

Perda de competitividade no contexto global e europeu

Não é por acaso que Portugal ocupa a 39.ª posição no World Competitiveness Ranking, tendo perdido onze posições desde 2000, e estando já atrás de alguns países do grupo de “Concorrentes”, entre os quais a República Checa (18º), a Estónia (26º) e Espanha (36º). O pilar da performance económica, em que Portugal caiu 26 posições, passando do 16.º para o 42.º lugar contribui negativamente para esta descida no ranking global. Do grupo de países concorrentes, só Itália, Estónia e Grécia estão pior classificadas em termos de performance económica.


Este é um cenário que a Associação BRP acredita que pode ser evitado através da criação de mais riqueza e do desenvolvimento social sustentável em Portugal.
“Andamos há várias décadas a discutir problemas como a fraca produtividade da nossa economia, os baixos salários, a lentidão da justiça ou o enorme peso da fiscalidade sobre as empresas e as famílias. Este não pode ser o legado que queremos deixar às futuras gerações”, salienta Pedro Ginjeira do Nascimento, Secretário-Geral da Associação BRP. “Acreditamos que Portugal pode e deve ser muito melhor. Este objetivo só é possível de alcançar através da implementação de políticas para promover o crescimento do país, valorizar os portugueses, criando, ao mesmo tempo, oportunidades de realização, e promover o crescimento e escala das empresas nacionais.”