Aníbal Campos: “É preciso políticos que conheçam o tecido empresarial”

Aníbal Campos, CEO da Silampos, deixa a sua visão para o país daqui a 20 anos.

Como é que olha para o país daqui a 20 anos?
AC – Com preocupação. Os hábitos de trabalho em Portugal estão a ser abandonados. Tenho experiências com pessoas de Leste que vêm com outra formação e que têm outra dedicação ao emprego. Nunca tive problemas. Os trabalhadores mais antigos aplicavam-se, dedicavam-se. Hoje as pessoas põem tudo à frente do trabalho. Querem ser felizes, têm direito, mas acho que primeiro têm de ter obrigações. Preocupa-me a mentalidade da sociedade portuguesa.

Por exemplo, sempre fui um defensor do serviço militar obrigatório, que é um tema que está agora em vigor. Lembro-me de o Dr. Mário Soares defender uma defesa conjunta na Europa. Se calhar tinha razão. E a tropa tem uma coisa boa: aprende-se o que é disciplina e o que é a hierarquia. Que é uma coisa que hoje os jovens não sabem. É com grande preocupação que acompanhei toda a evolução do ensino. Os professores perderam completamente a autoridade nas escolas.

E a forma como os jovens depois chegam às empresas é de desrespeito total por aquilo que é o funcionamento de uma empresa. Tenho aqui gente muito boa, mas ao nível de chão de fábrica é muito complicado. Não aceitam que se chame à atenção. Dão-se instruções de procedimentos e fazem como querem. E como sabem que não há alternativa, jogam com isso.

– Não quero entrar em terrenos políticos e muito menos partidários, mas não resisto a brincar. Estamos aqui numa casa de tachos e panelas, mas aqui os “tachos” são verdadeiros. Como olha para a classe política?
AC – Acho que os políticos são mal pagos. Eu se não pagar bem na minha empresa, não tenho bons quadros. É uma forma demagógica o povo dizer que eles querem é “tacho”. É evidente que a corrupção se alastrou, mas a qualidade dos políticos também é menor. Lembro-me de figuras que foram importantes para a minha empresa na área da economia. Veiga Simão, Mira Amaral… Sobretudo Mira Amaral. Um homem com uma visão da indústria fortíssima. Tenho uma relação de amizade muito grande, porque foi sempre um homem que não teve medo de apostar. O engenheiro António Guterres teve também uma visão para a indústria extremamente correta. O engenheiro Sócrates tinha uma visão para o país.

São necessárias pessoas que conheçam o tecido empresarial português, que é um tecido de PME. E, depois, a sociedade portuguesa também tem um problema, é que encara as grandes empresas como um mal. Fico muito contente por ver as empresas, os meus colegas, a crescerem e a montarem empresas. E os portugueses deviam ter orgulho na questão da imagem do país, porque são as grandes empresas que fazem a imagem do país.
Depois há outra questão que é que, em Portugal, mudam os governos e mudam as políticas todas. Enquanto presidente da AIMMAP, quando acabava de fechar dossiers com um ministro, voltava ao zero, porque, entretanto, tinha mudado o governo.

– Apesar da necessidade de reformas, está otimista referente ao futuro do país?
AC – Não sei, estou muito cético em relação à Europa. O país está dependente. Sou a favor da integração plena na Europa, mas acho que a Europa cometeu demasiados erros. A globalização foi mal feita. Na altura, tive oportunidade de alertar, em Bruxelas, para os erros que estavam a ser cometidos, mas foram preciso 20 anos para se reconhecer os erros que, na altura, se apontavam. A globalização foi completamente desregrada, nos interesses, sobretudo, dos alemães.
A indústria sofreu muito. Aliás, os erros foram cometidos porque a Europa desindustrializou completamente.