“Não somos um centro de emprego. Não abro vaga para o meu filho porque ele precisa de trabalho”, afirma CEO do Grupo Onyria

Grupo Onyria aposta nos hotéis de luxo, fatura cerca de 40M€ e emprega 500 pessoas.

Grupo Onyria aposta nos hotéis de luxo, fatura cerca de 40M€ e emprega 500 pessoas. Cinco irmãos sucessores trabalham na empresa, com o pai. O novo CEO, António Pinto Coelho, revela os próximos passos para expansão.

O Grupo Onyria tem apostado muito no turismo, sobretudo em Cascais, na Quinta da Marinha, e em Lagos, no Algarve. Mas há uma mudança, com o António agora também como CEO. Quais são os desafios do grupo para os próximos tempos?
António Pinto Coelho — O Grupo Onyria, em 2025, fará 40 anos e é um grupo marcadamente familiar. Os desafios das empresas familiares é crescer com harmonia. O nosso nome é Pinto Coelho e costumamos dizer, na brincadeira, que os coelhos multiplicam-se. Nós, na segunda geração, da qual eu faço parte, somos seis, e na terceira já vamos em 21 (risos).
Portanto, arranjar uma maneira de crescer de forma estruturada é o nosso grande desafio e a nossa principal missão enquanto gestores de segunda geração.


— Além da parte da hotelaria têm apostado numa série de outras áreas. De que valores estamos a falar, em termos de faturação e do número de pessoas que empregam?
APC — O Grupo Onyria, neste momento, está focado em quatro áreas de negócio. Na hotelaria, com um centro principal na Quinta da Marinha, através do Onyria Quinta da Marinha Hotel, que é um hotel que, curiosamente, vai fazer 25 anos este ano. Tem 200 quartos e foi o primeiro hotel desta zona. O hotel onde nos encontramos hoje, o Onyria Marinha Boutique Hotel, tem 72 quartos e temos 40 vilas, chamadas Onyria Quinta da Marinha Vilas, que estão à volta do campo de golfe da Quinta da Marinha. Isto é o centro de negócios de hotelaria do Grupo.
Temos uma segunda área de negócio que é a restauração e tem como marca-bandeira a Monte Mar, que cresceu na estrada do Guincho há muitos anos e, neste momento, tem mais três unidades, que é o Monte Mar Lisboa, Monte Mar Time Out Market, onde tem uma representação muito interessante.
A terceira área de negócio do Grupo tem que ver com o imobiliário de luxo residencial, que fizemos aqui na Quinta da Marinha durante muitos anos. São segundas residências e estão ligadas também a serviços turísticos. Neste momento, estamos a fazer aqui um projeto de 18 moradias.
Temos ainda uma área muito importante para nós e em que estamos a apostar muitíssimo que é a saúde, através do serviço médico permanente, estando também muito focados na residência sénior.
Todo este conjunto, no ano passado, faturou cerca de 40 milhões de euros, sem vendas imobiliárias, as quais separamos porque é um negócio que não é recorrente.
Neste momento, temos um universo de 500 colaboradores. Somos uma empresa familiar e recordo-me muito bem de o meu pai corrigir-nos nesta linguagem: não temos 500 colaboradores, temos 500 pessoas.
Nós tratamos de 500 famílias, que é a responsabilidade que devemos ter no dia a dia quando pensamos nas coisas.


— Os setores de hotelaria, de restauração, de imobiliário, como é normal, já tiveram altos e baixos, mas houve uma clara recuperação e reestruturação do grupo. Como é que conseguiram dar a volta?
APC — Mais uma vez, a parte da empresa de família tem um aspecto marcante nas nossas decisões. Temos sempre em vista o longo prazo.
Houve momentos difíceis, seguramente. Por exemplo, no programa de assistência financeira que houve em Portugal, derivado do subprime, em que todas as empresas que tinham exposição ao imobiliário sentiram dificuldades muito grandes. Nós não fomos exceção, sentimos grandes dificuldades.
O que fizemos foi um plano de longo prazo para recapitalizar a empresa, com a venda de alguns ativos. Tivemos sucesso porque conseguimos vender em preço, dentro dos nossos timings, com o cuidado com as pessoas que trabalhavam nessas áreas, para voltar a crescer. Este hotel onde estamos, por exemplo, foi um hotel que conseguimos recomprar.
Há esta superação, há este querer fazer bem numa lógica de maratona e não de sprint, porque queremos deixar bem feito e organizado para os nossos filhos e netos.

— Agora também beneficiam de uma conjuntura que é favorável na ocupação turística. Pelo que sei, estão com uma ótima ocupação em Cascais. Também acontece na parte do imobiliário?
APC — Certo, mas habituamo-nos também a conviver com a incerteza e com a instabilidade. A instabilidade passou a ser uma coisa quase normal, não é?
Repare nas guerras de que todos falamos, na inflação, nos custos de vida elevados, nas taxas de juros elevadas e até a Covid que foi ontem.
Durante a Covid, o efeito na hotelaria e na restauração, em especial, foi tremendo. De repente, temos as portas fechadas, não entra um único cliente e temos muitas responsabilidades para honrar. Ainda na Covid, como exemplo prático da abordagem que procuramos ter, o que fizemos foi um reinvestimento dos nossos ativos. Fizemos uma obra muito grande com a renovação total do Onyria Quinta da Marinha Hotel, uma renovação de 200 quartos. Nós estamos cá no longo prazo e a Covid não ia demorar 10 ou 20 anos, e, portanto, há que recuperar este ativo para quando as coisas melhorarem.
Ao dia de hoje, as perspetivas para o turismo são boas. Portugal está no mapa, pelas boas razões. E, para o imobiliário topo de gama, onde nos posicionamos, também há muita procura por Portugal. Procuramos capitalizar para reinvestir.
Não há aqui muitos estados de espírito com grandes variações, quer as coisas corram mal, quer as coisas corram bem. Não entramos nem em euforia, nem em depressão. Procuramos olhar para a frente e fazer o melhor que podemos todos os dias.

— Ainda nestas áreas, designadamente na área da indústria hoteleira, admite crescer com novas unidades e com parcerias? Qual poderá ser a estratégia?
APC — Sim, é essa a nossa ambição. Enquanto grupo hoteleiro, na Quinta da Marinha, somos proprietários, somos donos a 100% dos nossos ativos. Os ativos estão 100% na família. Fomos nós que fizemos a promoção desses ativos e somos nós o operador, que é uma coisa que não é muito tradicional. Muitas vezes até há uma divisão entre propriedade e operação. Temos no protocolo de família em como estes ativos vão ficar na família.
Estamos à procura de novas oportunidades e para as novas oportunidades estamos ativamente em contacto com potenciais parceiros, com outros ativos em que podemos entrar, noutros géneros de modelo de funcionamento.
Olhamos para contratos de arrendamento, olhamos para contratos de gestão, olhamos para co-investimento, com esta lógica, se calhar aborrecida, de estarmos sempre a olhar para o longo prazo.
Se alguém nos trouxer uma proposta de fazermos uma parceria no curto prazo, nós vamos passar e há seguramente outros players que vão fazer melhor trabalho que nós. Nós procuramos uma lógica de longa duração que está encaixada na filosofia do grupo.

— Esse aspecto também encaixa nesta aposta na área da saúde, olhando inclusive para as condições demográficas em Portugal, com o envelhecimento da população?
APC — É uma área de negócio muito interessante. Na Covid, os hotéis e os restaurantes no nosso portefólio não faturavam e a saúde faturava muito, pelas razões que se conhecem.
No nosso negócio do serviço médico permanente, o principal serviço é levar o médico a casa. Desde há três anos para cá, está também muito forte a telemedicina, ou seja, a consulta através de videoconferência. Esse negócio cresceu muito.
Somos um grande prestador de serviço, estamos em todas as capitais do distrito em Portugal. Prestamos serviço a grandes empresas, grandes seguradoras, subsistemas de saúde. Esta empresa também tem mais de 30 e tal anos, aliás, estamos quase a fazer 40 anos no serviço médico permanente.
Além disso, sempre tivemos uma área de negócio, não tão grande dentro do serviço médico permanente, que era prestar assistência médica a idosos nas suas casas.
Mais recentemente, conseguimos evoluir para o investimento nas residências sénior, assente numa lógica do que é uma residência sénior, um lar, mas que tem muito daquilo que um hotel tem na logística.
Tem cliente alojado, tem os serviços todos de limpeza, de comidas e bebidas, arrumação, segurança. Como já temos também os médicos para assistir a estas pessoas, fizemos essa evolução.
Neste momento, já começámos a operar um lar aqui na zona de Cascais e estamos ativamente à procura de novos lares.
Durante a Covid foi uma desgraça tremenda com muitíssimos casos de pessoas que morreram dentro dos lares, que não tinham condições… Portanto, queremos contribuir para ter um serviço de maior qualidade, mais digno e que também tenha a sua sustentabilidade económica, quer para nós, quer para as famílias que sustentam as pessoas mais velhas que nós queremos tratar bem.

– O protocolo de governance é muitas vezes um desafio, sobretudo nas empresas familiares. O António e os seus irmãos, na maioria, trabalham para o Grupo. Qual foi a filosofia acordada também com o vosso pai?
APC — Um primeiro passo e que foi muito interessante foi pedir os serviços de consultoria a alguém que tivesse um conhecimento muito profundo do meio empresarial e em específico das empresas familiares.
Tivemos a sorte de conseguir trabalhar com o engenheiro Luís Todo Bom, que é um especialista em empresas familiares. Com a sua ajuda construímos um protocolo de família em linguagem simples. É um manual, são as regras para conseguir diferenciar empresa e família e conseguir fazer a ligação entre as duas, de forma a gerir com harmonia.
A ideia é que o árbitro das eventuais disputas que existam no futuro seja o papel, com exemplos práticos. Na distribuição de dividendos: se tiver um irmão que não gosta tanto de distribuição e outro que precisa mais, realmente a regra estar definida em termos quantitativos no papel resolve as disputas.
Por exemplo, quem pode trabalhar na empresa familiar? Temos lá claramente quais são as regras e que são muito importantes essencialmente para a terceira geração. Só se pode vir trabalhar para a empresa familiar com cinco anos de experiência fora da empresa familiar e com uma licenciatura.
Outra regra importantíssima é a empresa ter de estar à procura dessa posição. Não somos um centro de emprego. Não vamos abrir uma vaga para o meu filho ou para o meu sobrinho porque ele precisa de trabalhar.

— Isso foi algo que vos foi incutido pelo vosso pai?
APC — Certo. Somos seis irmãos e cinco trabalham na empresa.
Todos temos, no mínimo, cinco anos de experiência antes de nos juntarmos ao grupo. Todos nos juntámos ao grupo para suprimir um lugar que estava em falta e todos somos muitíssimo desafiados para ter formação contínua.
No meu caso específico, quando vim para o Grupo, era licenciado em Gestão de Empresas. Vim para tratar de produto imobiliário e tive de fazer formação em gestão e avaliação de imobiliário, em hotel investment.
Temos de, no mínimo, acompanhar os profissionais mais competentes que trabalham connosco.
Nós fazemos uma maldade que tem muitas virtudes. Procuramos sempre recrutar pessoas que sejam melhores do que nós e depois temos de correr para acompanhar a sua competência.
Esta competitividade saudável que nós temos ajuda-nos a sermos melhores e a empresa também a ser melhor.

À minha maneira

– Quem é o António?
APC — Sou de 1979, portanto, neste momento tenho 44 anos. Sou casado, tenho três filhos e sou licenciado em Gestão de Empresas pela Universidade Nova de Lisboa.
Fiz formação também em Gestão e Avaliação de Imobiliário no ISEG e em Hotel Investments, em Cornell (Estados Unidos da América).
Comecei por trabalhar na banca. Trabalhei no Millennium BCP como trader numa sala de mercados durante cinco anos.
Depois fui desafiado para me juntar à empresa familiar, em que tive várias experiências como project manager na Quinta da Marinha e, depois, estive quase dez anos no desenvolvimento do Palmares Resort, que o nosso grupo comprou em 2003 e que desenvolvemos praticamente até final de 2019.
Estive dez anos com a família a viver no Algarve. Foi uma maravilha. O projecto está aí para durar, mas, entretanto, vendemo-lo.

— Qual é o seu estilo de gestão e liderança?
APC — Felizmente, aqui na empresa, temos uma política de recrutamento que saiu de forma muito feliz.
Portanto, a montante da liderança vem o recrutamento e a montagem das equipas. Este recrutamento é feito muito em valores pessoais. Ou seja, se aparecerem duas pessoas iguais, uma com um currículo fantástico em termos técnicos e outra com valores pessoais que têm mais que ver com a nossa lógica, vamos para a pessoa que tem os valores mais próximos da lógica da família e da empresa.
A questão da liderança está muito salvaguardada pelos valores da família e da empresa familiar.

Sim, conseguimos

Qual foi o maior obstáculo para o negócio, enquanto gestor, mas também em termos pessoais?
APC — Em termos de desafio, sem dúvida, a recapitalização do grupo. Como todas as empresas que estão dentro de uma economia como a portuguesa, o nosso grupo vai muito também ao sabor da economia dos mercados. Portanto, quando houve estes momentos disruptivos pela negativa, o Grupo teve de cerrar fileiras e recapitalizar-se para voltar a crescer.
Nós, portugueses, temos muitíssimas qualidades, mas uma que não temos é dizer bem de nós próprios. Este hotel em que estamos aqui a conversar, em 2013, no Tripadvisor (a plataforma de comentários mais conhecida em todo o planeta) foi o hotel número 1 da Europa e número 3 do mundo. Isto é um grande feito.
Pouco falado, pouco comunicado, mas que devemos estar orgulhosos-
A construção deste hotel teve um investimento muito avultado em euros. Os comentários dos clientes que nos puseram em número 1 da Europa, número 3 do mundo, era sobre o serviço.
Temos a felicidade de ter feitos incríveis, como estes do Tripadvisor, mas que resultam do trabalho de toda a gente que está aqui 365 dias.

Portugal 2043

Qual é a sua visão para o país e, eventualmente, também para o Grupo, nas próximas duas décadas?
APC — Portugal tem todas as condições para se posicionar como uma Flórida da Europa. Estamos num espaço europeu, mas somos um espaço diferente dentro da Europa, por aquelas coisas que falamos todos os dias: o clima, a gastronomia, a cultura, e, portanto, devemos diferenciar-nos como sendo um local excecional para visitar e para viver.
Essa deve ser a nossa visão, aquilo que nós gostaríamos que fosse, e achamos que está ao nosso alcance. É uma coisa que, trabalhando todos os dias e remando todos na mesma direção, está ali ao virar da esquina. Há progresso feito. Os portugueses, sempre que têm a necessidade de fazer alguma coisa, fazem-na e fazem-na bem. É preciso sermos organizados e termos uma meta comum.
Achamos que isto não é um sonho, é uma meta que está próxima, se todos estivermos direcionados no mesmo sentido.

— Quais são os principais obstáculos que identifica para o crescimento do país?
APC — A principal coisa que ambicionamos – e que nós empresários gostaríamos que houvesse sempre – é estabilidade, a todos os níveis. Estabilidade a nível legislativo e fiscal, aquilo que costuma ser as regras de jogo. Isso para nós é a coisa mais importante.
Também ligamos muito aos incentivos que possam existir a reinvestir. O que nós queremos, quando os anos correm bem, é reinvestir os nossos resultados para crescer e para as pessoas que trabalham connosco também crescerem.
Essa ideia tem de ser acarinhada. Portanto, se há incentivos para reinvestirmos, nós e outras pessoas vamos fazer mais isso aqui e não noutro sítio. Acho que era uma coisa que nos podia ajudar muitíssimo.