Roberta Metsola: Jovens e Política não é assim tão simples

Os políticos não devem fugir a questões difíceis. Devem ser francos e encarar os problemas

A Fundação Francisco Manuel dos Santos convidou a Presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, para participar no seu programa “Isto não é assim tão simples”, gravado ao vivo em Lisboa, perante uma plateia de centenas de jovens, a que se seguiu um debate sobre a participação dos jovens na política, moderado por José Maria Pimentel.

Na sua quarta visita a Portugal desde que foi eleita, a Presidente do Parlamento Europeu mais jovem de sempre, diz-se empenhada em visitar cada Estado-membro e interagir diretamente com os cidadãos, em particular aqueles que irão votar pela primeira vez, os que preferem não votar, os que não se sentem representados, estão desiludidos com os políticos ou não têm interesse em política. Propõe-se convencê-los do contrário. Afirmou que “a política é uma força para o bem”, mas esta não está isenta de obstáculos e desafios, tanto a nível nacional como comunitário.

Durante muitos anos, e em certa medida ainda hoje, Bruxelas foi vista como “distante”. A União Europeia, assente num complexo arranjo institucional, pode não ser sentida pelos cidadãos comuns, as pessoas podem não compreender por que razão são tomadas determinadas decisões, os políticos podem não saber ou querer explicá-las. É importante, contudo, que os políticos não tomem os cidadãos por garantidos. Mas o mesmo se pode dizer dos cidadãos, isto porque, de acordo com a Presidente, a democracia só funciona quando a responsabilização dos governantes é acompanhada da participação das pessoas. Para que a voz dos cidadãos seja ouvida, eles não podem recorrer apenas ao protesto, uma vez que o voto é ainda o instrumento fundamental para se fazerem ouvir.

“Quando votas e eleges um representante, tens alguém com quem interagir durante os próximos 5 anos”. Caso contrário, poderás não ter ninguém que te represente, o que só contribuir para aumentar frustrações. Reconheceu, no entanto, que se a União Europeia tem de ser, por natureza, complexa, há ainda entraves burocráticos que a tornam distante das pessoas, tornando difícil tanto a compreensão das mensagens políticas como algumas questões práticas -, dando o exemplo dos fundos europeus. Isso tem de mudar.

Na verdade, os cidadãos de diferentes Estados-Membros ainda não têm “igual acesso” e também aí há trabalho que tem e pode ser feito. Quanto ao órgão que preside, relembrou a audiência de que nos últimos anos os seus poderes têm aumentado. O PE tem direito de iniciativa legislativa, é co-legislador e autoridade orçamental, além de responsabilizar as restantes instituições europeias e os próprios Estados-Membros relativamente aos critérios cujo cumprimento deve estar assegurado aquando, mas também depois da adesão.

Roberta Metsola disse compreender a frustração que muitos sentem em relação aos partidos tradicionais, que nem sempre têm sido capazes de se adaptar às mudanças que a sociedade exige ou testemunha. Contudo, relembrou que foram estes mesmos partidos a encontrar as saídas para alguns dos piores momentos vividos pelos europeus nos últimos anos. À cabeça, a pandemia e a crise económica subsequente. Este período, com todos os impactos negativos que teve na vida das pessoas, foi também um momento em que a Europa se mostrou à altura, sendo capaz de uma resposta unida e adequada. Outras crises se seguiram e seguirão: a guerra na Ucrânia e as alterações climáticas são apenas alguns exemplos.

Hoje, é claro para os cidadãos que há questões cuja solução passa invariavelmente pela Europa, sendo as migrações mais uma destas problemáticas. Há quem tenha a tentação de culpar a Europa quando há problemas, mas esquecer-se dela na hora dos sucessos.

Nesta conversa com José Maria Pimentel, Metsola refletiu sobre o seu percurso na política, iniciado em tenra idade, numa altura em que Malta ainda não pertencia à UE. Foi esse desígnio que a levou a participar ativamente na política. A Presidente já então reconhecia que só dentro da Europa os malteses veriam a situação económica do seu país melhorar. Mas havia ainda outras vantagens a retirar da adesão: progresso social, melhoria do funcionamento da justiça, proteção do ambiente e concretização da igualdade. De lá para cá, a política tornou-se mais aberta à participação ativa das mulheres, mas nem tudo é hoje mais fácil.

Em diversos momentos, ao longo da conversa, Metsola identificou a divisão, a polarização e a intolerância como fenómenos que têm corroído as sociedades e as famílias. Para isso têm contribuído a internet e as redes sociais. Se, por um lado, estas tornaram mais fácil a comunicação dos políticos com os cidadãos, por outro, acarretam riscos, como a desinformação que se torna viral e à qual é difícil responder eficazmente.

Para Metsola, “é muito mais fácil ser a preto e branco”, “os tons de cinzento são menos entusiasmantes, menos sexy. Não obstante, cinzento é o mundo.” Sendo fácil dar respostas simples a perguntas complexas, a responsabilidade dos políticos determina que ajam de forma diferente, escolhendo o caminho alternativo.

Para a Presidente, os políticos não devem fugir a questões difíceis, mas optar por ser francos e encarar de frente os problemas. No final, sentiu-se a inspiração que os jovens ali presentes receberam de uma líder europeia que se mostrou próxima das pessoas, assim demonstrando que vale a pena não apenas dedicar atenção às questões europeias, como, em geral, apostar na participação cívica e política dos cidadãos.