Aprender com o Infante D. Henrique, em 9 lições

Regras de liderança do Infante D. Henrique que podem ser aplicadas hoje.

A História repete-se? 880 anos de História de Portugal convidam-nos a reflectir sobre lições de liderança passada que podemos capitalizar no nosso futuro. Os líderes de hoje precisam conhecer a História para aprender com ela; algo bem mais útil do que repeti-la.
No próximo dia 8 de janeiro terão passado 570 anos desde a Bula Papal “Romanus Pontifex”, onde o Papa Nicolau V concede ao rei D. Afonso V de Portugal, a seus sucessores e ao Infante D. Henrique os direitos de conquista, ocupação e apropriação de todas as terras, portos, ilhas e mares de África, já conquistados ou que de futuro vierem a conquistar.
Esta Bula marca o início da Doutrina da Descoberta (e a “justificação” jurídica do Colonialismo dos séculos subsequentes), defendendo que a “descoberta” de terras era equivalente à sua “propriedade”, no contexto de paradoxo histórico entre o fim da Idade Média e o início da Idade Moderna. De facto, o Infante D. Henrique foi uma personalidade dividida entre o passado medieval e o Renascimento que estava então a começar.
Além de combatente destemido em Ceuta e em Tânger, o Infante foi um homem de ciência e um extraordinário líder. “Talant de bien faire”, ou “Vontade de fazer bem”, foi a divisa escolhida pelo Infante para nortear a sua vida. É um mote que revela uma personalidade determinada e ambiciosa, bem como um carácter incansável e implacável. A sua liderança durante a Era dos Descobrimentos oferece nove lições valiosas que podem ser aplicadas ainda hoje:

1. Visão: O Infante D. Henrique tinha uma visão clara de exploração e expansão comercial e da fé cristã, estabelecendo metas de longo prazo que inspiraram e orientaram as suas iniciativas. A sua visão de explorar territórios desconhecidos orientou os esforços de navegadores, cartógrafos e exploradores que fizeram parte de suas expedições patrocinadas. A sua visão definiu objetivos estratégicos para os empreendimentos marítimos de Portugal que perduraram para além da sua morte.
Lição: Articule uma visão convincente que motive e oriente as suas equipas a longo prazo.

2. Conhecimento: Investiu em centros de navegação, pesquisas e expedições, fomentando o conhecimento sistemático (o mapeamento detalhado dos ventos no Atlântico é notável). Assumiu as funções de “protetor e governador da Universidade” em Lisboa, onde tinha sido transferida de Coimbra, para além de introduzir nos currículos universitários a matemática e a astronomia, que se juntaram às disciplinas medievais de gramática, retórica e lógica.
Lição: Invista no conhecimento e aprendizagem para impulsionar crescimento e avanço.

3. Diversidade: D. Henrique promoveu um ambiente multicultural, incentivando a colaboração entre profissionais de diversas origens, debaixo da proteção da Casa do Infante. Vieram judeus, mouros, genoveses, venezianos, flamengos, alemães, castelhanos, ingleses, franceses, noruegueses, canários, e até abissínios. Entre eles, foram muito notáveis o mestre cartógrafo Jaime de Maiorca (judeu), António de Nole (genovês), Cadamosto (veneziano) e Valart (norueguês). A colaboração entre sábios/mestres provenientes das três religiões monoteístas é inovadora e marcante sobre o poder da diversidade para ruturas transformacionais.
Lição: Abrace a diversidade dentro das equipas para promover a criatividade.

4. Inovação: Estimulou ideias e técnicas inovadoras, contribuindo para avanços na navegação e exploração. A integração de vários contributos, mais a inteligência com sentido prático, gerou o astrolábio náutico português, tendo sido também pela primeira vez calculada a latitude no mar e usada a Estrela Polar, cuja altura acima do horizonte corresponde, aproximadamente, à latitude do observador. A caravela, ao permitir avançar contra o vento no Atlântico, foi uma inovação fundamental desta época, inspirando-se nas dhows do Mar Vermelho (a vela latina é, em si, uma invenção árabe).
Lição: Incentive uma cultura de inovação e forneça espaço para experimentação.

5. Planeamento: O planeamento permitiu que traduzisse os seus objetivos visionários em estratégias viáveis. Elaborou planos para patrocinar expedições, estabelecer centros de navegação e apoiar viagens exploratórias, alinhando-as com sua visão de longo prazo. O planeamento ajudou na alocação eficiente de recursos – financeiros, humanos e tecnológicos – para apoiar as suas viagens ao longo da costa de África.
Lição: Planeie e concentre-se em objetivos a longo prazo, em vez de ganhos de curto prazo.

6. Adaptabilidade: As expedições do Infante envolveram aprender com os fracassos e adaptar-se a novas informações. Recolheu, analisou e avaliou, através dos roteiros e dos diálogos com os comandantes em cada regresso a Lagos (com quem falava logo à chegada), os resultados da experimentação na arte de navegar, na observação astronómica e meteorológica, na construção de cascos de navios, velas e instrumentos de navegação.
Lição: Promova aprendizagem contínua, adaptabilidade e resiliência diante dos desafios.

7. Delegação: A deslocação de um lugar para outro iria requerer um investimento de tempo que o Infante deixou à responsabilidade dos seus navegadores (só se lhe conhecem quatro viagens de barco fora de Portugal, sempre para o eixo Ceuta-Tanger). Delegando e concentrando todas as suas energias no mesmo fim, conseguiu dedicar-se em exclusivo às suas grandes ambições e parecer que dispunha de tempo para tudo, ao demonstrar confiança nos seus comandantes.
Lição: Foque-se no que faz melhor e delegue o restante de forma eficaz.

8. Resiliência: Apoiou expedições arriscadas, incentivando uma cultura de assunção de riscos calculados e experimentação. Durante 14 anos a partir de 1420, chegado o Verão, enviava navios – e só em 1434 é dobrado o Cabo Bojador por Gil Eanes. As suas ordens eram sempre iguais: avançar o mais possível para sul e trazer novas da desconhecida costa africana. Foi a curiosidade e o espírito audaz revelados na expressão “Mais avante!” (ou “Mais para Sul!”) que levaram as caravelas ao Atlântico e a descer a costa africana.
Lição: Promova um ambiente resiliente, assuma riscos e aprenda com os fracassos.

9. Diferenciação: O Infante manteve o conhecimento e a inovação desenvolvida em vida como fatores diferenciadores “secretos”. Os conhecimentos adquiridos nas viagens portuguesas foram mantidos bem guardados das outras nações. As atualizações das cartas eram apenas do conhecimento do Infante e dos seus comandantes e cartógrafos, bem como os rumos, instrumentos e novos tipos de navio.
Lição: Tenha sempre claro qual o seu factor de diferenciação e proteja-o.

O Infante Dom Henrique, o Navegador, foi um dos primeiros exemplos do Homem Renascentista segundo alguns historiadores, ou – segundo outros – o falhado sonhador medieval que conquistou e manteve Ceuta à custa do erário público, abandonou o irmão em Tanger e iniciou a escravatura no Atlântico.
De qualquer modo, as suas lições de liderança podem inspirar os líderes modernos a definir objetivos visionários, promover a inovação, abraçar a diversidade e enfrentar eficazmente os desafios nas suas organizações.

Sócio da Egon Zehnder (Portugal)