Faça uma reflexão sobre os alimentos que consome: onde foram comprados, o motivo das suas escolhas, o preço, a acessibilidade do local onde fez as compras ou a existência de promoções.
Fazendo este exercício, chegaríamos à conclusão de que as escolhas alimentares dependem das oportunidades físicas, económicas e até socioculturais que se conjugam no momento da compra. A forma como nos alimentamos é induzida, demasiadas vezes, por fatores externos.
São vários os fatores associados às escolhas alimentares e estes influenciam de forma considerável as opções dos consumidores. Em Portugal, é prioritário alinhar estratégias e ações que tenham em atenção a criação de ambientes alimentares saudáveis.
A prazo, o investimento na promoção de uma envolvente capaz de promover saúde e prevenir a doença conduzirá à melhoria do estado nutricional da população e levará à redução da prevalência das doenças crónicas relacionadas com a alimentação inadequada. Ao mesmo tempo diminuir-se-ão as desigualdades de oportunidades existentes aquando das escolhas dos consumidores.
Entre nós, os maus hábitos alimentares não são novidade. O tema é regularmente debatido e há algum investimento na área, mas os resultados não são animadores: projeções indicam que, em 2030, as mortes causadas pela alimentação inadequada ultrapassarão as provocadas pelo tabaco.
A obesidade assume proporções de verdadeira epidemia. Os dados do último Inquérito Nacional de Saúde com Exame Físico, de 2015, evidenciam que mais de 67% da população adulta se encontrava com excesso de peso, sendo que a obesidade afetava 2,5 milhões de pessoas. Nas crianças, o cenário é preocupante com uma em cada três crianças a apresentar excesso de peso. Entre 2008 e 2019, Portugal apresentou consistentemente uma tendência invertida da prevalência de excesso de peso e obesidade infantil, mas em 2022 esta tendência não se confirmou, registando-se um aumento de 1,6 pontos percentuais (11,9% para 13,5%) na prevalência de obesidade infantil e de 2,2 pontos percentuais (29,7% para 31,9%) na prevalência de excesso de peso infantil.
Haverá dúvidas acerca do caminho a seguir?
Um estudo de 2022, da Direção-Geral da Saúde, desenvolvido para avaliar o desempenho do país na implementação de políticas públicas para a criação de ambientes alimentares saudáveis, apontou várias ações urgentes. Entre elas: a taxação e a reformulação de algumas categorias de alimentos, a monitorização regular do consumo alimentar e do estado nutricional da população, a adequação do rácio de nutricionistas nos cuidados de saúde primários e a efetiva implementação das orientações existentes para a oferta alimentar em meio escolar.
A redução do IVA em alimentos saudáveis, também proposta neste estudo, é já realidade. Um passo para o acesso a uma alimentação mais adequada. Mas, há ainda muito para fazer, apesar de Portugal procurar cumprir com algumas recomendações nesta matéria.
A verdade é que ESCOLHER BEM TEM DE SER FÁCIL e para isso os consumidores não podem ficar reféns das diferentes variáveis aquando das suas escolhas. Torna-se fundamental estudar os tipos de ambiente alimentar nas diversas comunidades, implementando soluções mais eficazes.
A resposta passa por haver oferta de maior qualidade. Qualidade que pode ser posta em causa por preços mais elevados, desertos alimentares ou produtos culturalmente não adequados. A construção de ambientes alimentares saudáveis necessita de um trabalho conjunto entre os diferentes intervenientes no processo: setor agrícola e agroindustrial, comércio, educação, saúde, entre outros.
É urgente reformular as políticas públicas para a promoção de ambientes alimentares saudáveis e desenvolver novas políticas. É igualmente imperioso implementar estratégias que potenciem a literacia alimentar da população. Só assim podemos contribuir, de forma significativa, para a garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada.
Alexandra Bento
Nutricionista. Especialista em Nutrição Comunitária e Saúde Pública