AI Act: amigo ou inimigo da inovação?

Incerteza da regulamentação faz investidores apostar em mercados fora da Europa

As eleições europeias estão a aproximar-se a passos largos e multiplicam-se os esforços de apelo ao voto nestas que serão as quartas eleições em Portugal este ano. A menos de dois meses da aprovação da primeira legislação que vem regular a inteligência artificial (IA), estamos agora mais cientes daquele que é o impacto das regulamentações europeias no nosso quotidiano e a nível nacional.

Independentemente do setor em questão, não há como negar que há uma grande influência europeia nas leis nacionais, pelo que importa refletir até que ponto as regulamentações, como o AI Act, podem vir a colocar uma barreira à inovação.

O AI Act foi desenvolvido pela Comissão Europeia e, à partida, parece ser vantajoso, mas, devido à forma como foi construído, suscitou muitas dúvidas ao longo do processo. Embora pretenda tornar o desenvolvimento e a utilização da inteligência artificial (IA) na Europa fiável, transparente e favorável à inovação, as nuances deixadas no regulamento podem dificultar o arranque e a expansão das startups na Europa.

A legislação veio restringir os sistemas de IA generalizados, que são particularmente importantes para as startups, uma vez que têm muita memória, dados e hardware potente e exigente. Além disso, estes sistemas são fiáveis em termos de transferência de aprendizagem e podem ser utilizados numa vasta gama de domínios.

Um estudo da Iniciativa para a IA Aplicada mostrou que 73% dos investidores em capital de risco acreditam que o AI Act reduzirá, significativamente, o mercado competitivo para as startups de IA. Ao serem atraídos pela certeza, os investidores em capital de risco começaram por optar investir em mercados fora da Europa (os EUA e a China são os países mais avançados e com mais investimentos nesta área), devido à incerteza que a regulamentação traz. Tudo isto fez com que os reguladores reconsiderassem a abordagem de risco, diferenciando as startups e as empresas de acordo com o nível de risco da sua IA.

O AI Act tem agora um âmbito de trabalho muito mais específico, sendo aplicado aos fornecedores que colocam no mercado ou põem em serviço sistemas de IA na União Europeia (UE), independentemente de esses fornecedores estarem estabelecidos na UE ou num país terceiro, desde que sejam considerados de alto risco.

Os sistemas de IA generalizada têm um grande impacto e representam um risco sistémico, pelo que devem fazer avaliações de modelos para analisar e reduzir os riscos sistémicos, fazer testes contraditórios e informar a Comissão Europeia sobre incidentes graves, garantindo a cibersegurança e apresentando relatórios sobre a sua eficiência energética.

Houve muitos avanços e recuos relativamente a uma lei que, pela primeira vez, regula os sistemas de IA na UE, sendo que o documento final aprovado deverá começar a ser aplicado até 2026.

Legislar estas áreas de trabalho permite que a tecnologia e a inovação avancem de forma ética e responsável, sendo positivo que os reguladores considerem as startups e o que elas defendem. Agora que esta já é uma realidade, é preciso que existam organizações que ajudem as startups a caminhar este percurso de regulamentações e policies (por exemplo uma Startup Portugal ou uma Agência Nacional de Inovação), para que não se assumam como um entrave à inovação.

Apesar da necessidade da legislação à IA não ser questionada, as dúvidas têm surgido em relação ao seu impacto à inovação e ao surgimento de novas ideias em setores considerados de maior risco. Ainda que as novas exigências possam trazer dificuldades às empresas em colocarem os produtos e serviços no mercado, não há, efetivamente, nenhuma limitação ao processo de investigação.

Ainda que este seja um dos exemplos mais recentes e mediáticos a que nos podemos agarrar, a verdade é que retrata uma realidade que se tem de tornar clara: a União Europeia, e do que dela provém, tem uma grande influência nos seus países-membros.

Além disso, as startups europeias podem estar a colocar-se em vantagem: as empresas europeias podem já estar a cumprir os processos regulatórios dos quais as startups americanas ainda não estão conscientes e que podem vir a implementar mais tarde. Mas isso será para cenas do próximo capítulo.

Co-fundador e Chief Growth Officer at Beta-i