Turismo. Sazonalidade vai diminuir, mas faltam apoios do Governo

Fazer turismo fora da época alta é uma tendência futura, mas Francisco Madelino, presidente do INATEL, afirma que o Estado deve atuar e criar procura. França e Espanha são exemplos a seguir.

A chamada época alta do turismo – que atinge o pico no verão – pode estar em vias de extinção. Segundo Francisco Madelino, presidente da Fundação INATEL, a tendência é que no futuro haja cada vez mais uma diluição das épocas baixa e alta, reduzindo a sazonalidade do setor.

Em novembro de 2022, de acordo com os dados do INE, as dormidas atingiram as 743 mil, uma subida de 14,1% face ao mês homólogo de 2021. Podemos estar a assistir a uma redução da sazonalidade do turismo?
Francisco Madelino – O turismo tem vindo nos últimos anos a reduzir a sazonalidade. Os meses altos eram os de julho e agosto e digamos que este pico, esta curva, começou a alargar-se para meses de junho e setembro.
As alterações climáticas também ajudam, mas sobretudo ajuda o crescimento e o facto de Portugal ter ganho um conjunto de prémios e ser reconhecido a nível internacional.
Este fenómeno começou pela área de Lisboa, depois passou para a área do Porto e também para o Algarve e depois começou a extravasar para outros pontos do país e mesmo para outras épocas. A ocupação em Lisboa e no Porto começou a subir fora dos meses que vão entre junho e outubro, que já tinham tido um alargamento.

A pandemia da Covid-19 também contribuiu para isso..
A recuperação da pandemia seguiu duas fases. O ano passado sobretudo através do turismo interno e este ano muito por turismo externo. Os dados macroeconómicos também mostram isso. O segundo trimestre deste ano cresceu sobretudo pelo setor turístico. Ainda não é um trimestre em alta, mas é mais uma manifestação de que a sazonalidade do setor turístico está a diminuir.

Esta redução da sazonalidade deverá ser uma tendência a manter-se no futuro?
É uma tendência futura e seria bom se se expandisse para o interior do país. Com as alterações demográficas e a desertificação, essa capacidade de levar o setor turístico para o interior e baixar a sazonalidade é importante para ser uma atividade rentável e até combater esta desertificação. É muito difícil ter rentabilidade no setor turístico apenas com base em dois ou três meses.
A sazonalidade tem vindo a baixar, o que tem feito com que surjam novos investimentos turísticos em áreas como a Serra da Estrela, mas é determinante que ela passe para o interior do país e que seja o próprio Estado a promover a procura desses setores.

Como é que se pode incentivar o turismo em época baixa e combater a sazonalidade e o desemprego? A Fundação Inatel teve o programa Turismo Sénior, por exemplo…
Sim, é um programa que existiu através dos programas comunitários e que se espera que venha a existir.
Sabemos que há muitas pessoas que não têm acesso ao turismo, ainda cerca de metade dos portugueses não passam férias. O Estado tem de atuar, por razões de saúde ou por razões sociais, e criar procura, apoiar e pagar uma parte significativa da estadia.
Por exemplo, se for a Espanha ou França, há políticas públicas muito “agressivas”, no bom sentido, de apoiar a utilização das termas ou de determinado tipo de infraestruturas no interior. Por um lado, para que um conjunto de pessoas tenha acesso à atividade turística, mas sobretudo para que regiões do interior tenham uma atividade económica que contrarie a desertificação.
Em França, nos descontos que as pessoas fazem para a segurança social, há depois uma componente de apoio do Governo que são os chèques-vacances, ou seja, dão cheques para passar férias e podem restringi-los nas zonas onde o fazer.
É apenas um apoio ao motor de arranque para este tipo de atividade se desenvolva porque o ideal é que as pessoas tenham todas dinheiro para passar férias e fazer atividade turística e que os hotéis funcionem regularmente em mercado.

O aumento dos preços na época alta associado ao crescente custo de vista e da inflação, não poderá levar muitos portugueses a não passarem férias cá dentro?
É verdade que o setor turístico foi dos que mais aumentou – cerca de 100% em alguns casos -, mas isso não é necessariamente mau. O que é mau é que os portugueses não possam passar férias e a atividade económica não gere rendimentos para essas pessoas que não podem passar férias nem cá dentro nem lá fora.