Conferência AIMMAP: Indústria a “Pensar Futuros”

Industriais do Metal pediram simplificação legislativa e a “valorização do trabalho”. O ministro da Economia concordou. Encontro anual da AIMMAP, com o tema “Pensar Futuros” realizou-se no dia 20 de maio, em Aveiro, em parceria com o Portugal Amanhã.

Os “Tempos Modernos”, de Charlie Chaplin, marcaram na cultura popular uma indelével impressão sobre a indústria. A indústria metalúrgica e metalomecânica evocam particularmente a imagética filme: as linhas de montagem, o fumo, o trabalho repetitivo, o barulho. Mas esta ‘modernidade’ foi consagrada à película há quase 90 anos. Esta é hoje “uma indústria de futuro”, afirmou Vítor Neves, presidente da Associação dos Industriais Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal (AIMMAP), que se reuniu no dia 20 de maio, em Aveiro.

Foi para “Pensar Futuros” que o encontro anual da AIMMAP decorreu na Universidade de Aveiro, num esforço de “levar a indústria à academia e a academia à indústria”, explicou Mafalda Gramaxo, diretora-geral da organização, que recordou também a presença e importância de empresas deste setor naquele distrito.

A “Metal Portugal” reúne 23 mil empresas, com um total de 245 mil postos de trabalho. O setor representa mais de 38.8 mil milhões de euros em volume de negócios, o equivalente a cerca de 15% do PIB português. Deste número, cerca de 24 mil milhões de euros corresponde a exportações
Com parceria do Portugal Amanhã, o evento incluiu a participação do ministro da Economia, Pedro Reis, e Armindo Monteiro, presidente da Confederação Empresarial de Portugal, seguindo-se três painéis com especialistas sobre três eixos de reflexão para o futuro do setor e da economia portuguesa — Inteligência Artificial, Pessoas, e Tecnologia e Economia —, moderados por Luís Ferreira Lopes, diretor do Portugal Amanhã.

“Temos de mudar, temos de simplificar”

“O país decidiu por uma mudança” nas eleições de 10 de março, afirmou Vítor Neves, acrescentando que a conferência foi “o contributo da AIMMAP nesse sentido”. Na intervenção de abertura, o presidente da associação “aproveitou a presença do senhor ministro” para apelar a uma “profunda simplificação legislativa e de processos” e à “valorização do trabalho e do investimento”.

“Temos um emaranhado legislativo que dificulta a vida a todos, cidadãos, contribuintes e empresas”, afirmou, destacando que o “emaranhado” resulta em grande parte da transposição da regulamentação comunitária. “Quem conta um ponto, acrescenta um ponto”, notou Vítor Neves, que relacionou “a velocidade estonteante” da atividade legislativa e regulamentar de Bruxelas com a perda de competitividade do bloco comunitário. “Temos de mudar, temos de simplificar”, sublinhou.

O presidente da AIMMAP apelou também à “valorização do trabalho e do investimento”, afirmando ver “com preocupação a noção que se começa a formar de que trabalhar menos é produzir mais”. As empresas devem “investir massivamente” na produtividade e qualificação da mão-de-obra, considerou, mas esse esforço terá de ser acompanhado por políticas públicas que incentivem a esse investimento.

“Continuamos a ser um dos setores mais dinãmicos da economia portuguesa e a mais importante indústria exportadora”, concluiu Vítor Neves, na sequência de um máximo histórico no valor das exportações do setor metalúrgico e metalomecânico em 2023, que cresceu 4.1%.

“Sintonia” e “cumplicidade estratégica”

O presidente da CIP saudou a iniciativa da AIMMAP, que considerou estar “a construir soluções tendo em conta o momento que vivemos na Europa”. Armindo Monteiro, numa intervenção gravada e transmitida em vídeo, afirmou que a importância do setor não se limita à dimensão dos números que representa. Antes, “o dinamismo e visão de futuro” do setor contrasta com uma “visão no país, que conhecemos bem, de pessimismo”.

“É extraordinário que seja uma associação setorial a motivar uma reflexão sobre um tema tão fundamental para todas as empresas”, elogiou.

 O presidente da CIP dirigiu-se também ao ministro da Economia, que assegurou “conhecer bem as empresas, a economia e o país”. Considerando que “a prosperidade nacional começa obviamente nas empresas”, Armindo Monteiro afirmou que Pedro Reis “tem todas as condições para ser um verdadeiro ‘ministro das Empresas”.

Há “cumplicidade estratégica” na visão para Portugal entre a AIMMAP e a CIP, declarou Armindo Monteiro. Esta “lealdade e sintonia” faz “da CIP mais forte e faz as empresas mais fortes e mais dinâmicas”, concluiu.

“O Estado está ao serviço das empresas”

A intervenção final na abertura da conferência “Pensar Futuros” coube ao ministro da Economia. Pedro Reis classificou o setor metalomecânico e metalúrgico como “o tutano” da “coluna vertebral da economia portuguesa” que a indústria representa. “Ainda por cima uma coluna vertebral ligada ao cérebro, ligada à evolução”, acrescentou, a propósito da presença de alunos e académicos no auditório da Universidade de Aveiro.

Aproveitando o repto das intervenções anteriores, o ministro da Economia sublinhou ser  “claro que o crescimento económico assenta na iniciativa privada”, cabendo ao setor público “o foco na execução”. “Acompanho por inteiro a mensagem sobre a simplificação”, declarou Pedro Reis, frisando que “a burocracia é aquilo que só está nas nossas mãos atuar” por não depender de outros agentes.

 O ministro da Economia defendeu ainda a necessidade de consistência nas opções políticas – bem como a urgência de tomar decisões. “Pensamos bem, mas distraímo-nos rápido”, resumiu. Recordando as décadas de indecisão sobre infraestruturas estratégicas, Pedro Reis defendeu as opções do Governo a propósito do aeroporto de Lisboa, a terceira ponte sobre o Tejo e a ligação a alta-velocidade com Madrid. Com a economia portuguesa como “uma placa giratória” entre Europa, Ásia e Américas, as decisões do Governo sobre o novo aeroporto de Lisboa, a terceira ponte sobre o Tejo e a ligação a Madrid a alta-velocidade serão opções do qual “ainda estaremos a tirar benefícios” no futuro. “É uma oportunidade gigantesca para as empresas”, rematou.

“Sim, senhor Ministro”

Uma “agenda de reformismo responsável” será a responsabilidade do Estado e do setor público, declarou Pedro Reis.

“É preciso trabalhar na capitalização e no investimento”, indicou o ministro da Economia, recordando o objetivo do Governo de agilizar a execução do PRR e do PT2030. “As empresas portuguesas não podem mais esperar”, admitiu, lembrando a promessa de colocar o Estado a pagar a 30 dias e a operacionalização do Banco de Fomento. Pedro Reis defendeu ainda a importância de gerar mais grandes empresas em Portugal, que possam mobilizar “a energia das startups e dos empreendedores e uma rede de PMEs que as sustentam”. “Ganhar dimensão não pode ser um castigo, tem de ser um prémio”, declarou. E acrescentou: “O ministro da Economia está ao serviço das empresas”.

Sobre o investimento, Pedro Reis invocou a sua experiência na AICEP antes de explicar que as circunstâncias atuais representam uma oportunidade para Portugal. “A decisão do investidor há uns tempos era apenas ‘onde é que eu sou mais eficiente?’. Hoje, é diferente”, porque se considera também o acesso e qualidade da inovação e do talento. “O mundo está hoje a movimentar-se, mas não vai ser sempre assim. Eventualmente vai cristalizar. Temos 4 a 5 anos para nos posicionarmos e captarmos alguns clusters e setores estratégicos”, defendeu o ministro da Economia, considerando que o de-risking será uma oportunidade para atrair mais investimento para o país.

“Este setor [metalúrgico e metalomecânico] tem muitos desafios e oportunidades interessantes”, indicou, acrescentando que “se as conseguir resolver, é porque tudo está a funcionar bem também nos outros setores”, uma vez que será possível “articular em rede a escala que às vezes não se tem”. Mas o ministro avisou que a aposta na qualificação e inovação não pode ser exclusivamente das micro e pequenas empresas: “muitas vezes pede-se muito a muitos sem pedir mais a quem tem mais responsabilidade”, atirou. Mas com a ressalva do “perigo do fascínio” e de “estar sempre a querer inventar novos setores e novas áreas”, porque a aposta na inovação não pode sacrificar a consolidação e controlo das cadeias de valor.

O ministro da Economia realçou que “não faz sentido falar da economia interligada, articulada, e não pedir ao Ministério que também o faça”, uma vez que “é o Estado que está ao serviço das empresas, não o contrário”. Cabe ao setor público desencadear “uma agenda de reformismo responsável, assente na competitividade e na escala”, declarou Pedro Reis. Se assim for, “Portugal tem todas as condições para ser uma potência exportadora e internacionalizada com base na inovação e no talento”, concluiu.

 “Penso que podemos esperar uma mudança com algum significado”, declarou o presidente da AIMMAP no final do evento.