A sustentabilidade é hoje um tema incontornável em qualquer setor de negócio. Conhecida como uma das maiores empresas da indústria do tabaco, a Philip Morris (PMI), dona da Tabaqueira, não ficou indiferente aos novos tempos e está num processo de transformação radical do modelo de negócio.
Com vista à “criação de um futuro sem fumo”, desenvolveu “produtos sem combustão e menos nocivos”, que representam já 36,4% das receitas do grupo, “como uma alternativa para todos os fumadores”.
Para melhor entender esta nova viragem e como o ecossistema empresarial se pode tornar mais sustentável, estivemos à conversa com Jennifer Motles, Chief Sustainability Officer da PMI, de passagem por Portugal a propósito da conferência “Transformar a economia de Portugal através da sustentabilidade e da inovação”, apresentada pelo Financial Times na passada terça-feira.
Quais são as maiores tendências e desafios em sustentabilidade que as empresas enfrentam atualmente, em Portugal e a nível europeu?
Quando pensamos em tendências de sustentabilidade há dois grandes desafios. Um é em relação à performance em sustentabilidade, em questões ambientais e sociais, ou seja, garantir que, enquanto empresas, estamos a criar impacto e a gerar mudança. E o outro é o reporting. Na União Europeia existem muitas leis que exigem que as empresas reportem, de uma forma muito específica, em relação ao seu desempenho e à sua performance, ou seja, demonstrar que impactos é que estão a ter em temas de sustentabilidade.
Isto representa uma grande mudança, porque, tradicionalmente, a sustentabilidade para as empresas tem sido sempre voluntária. Agora está a tornar-se obrigatória, regulada, estrita e muito definida. Acho que esse é um dos maiores desafios: saber definir, medir e reportar a sustentabilidade.
Como é que as empresas podem usar práticas sustentáveis para aumentar o crescimento económico e criar valor a longo prazo?
Por muito tempo, as pessoas pensavam em sustentabilidade apenas como uma forma de fazer algo positivo. Mas a verdade é que, quando pensamos em sustentabilidade para as empresas, isso precisa de ser parte da estratégia de negócio. Para fazer sentido, precisa de estar ligada à criação de valor e a um modelo de negócio que crie valor para os clientes, para os colaboradores e também para a sociedade e o planeta. É um desafio difícil, porque tradicionalmente não pensávamos dessa forma, mas é algo imperativo.
Em relação à PMI, também aqui em Portugal, a estratégia de sustentabilidade é transformar o nosso negócio e transformar o nosso produto e afastarmo-nos dos cigarros. É importante ter a compreensão do tipo de impacto negativo que criamos e como podemos usar os nossos recursos para mitigar os impactos negativos ou e ter uma estratégia de negócio e um modelo que procure apenas criar impactos positivos.
A própria Tabaqueira, subsidiária da PMI em Portugal, tem adaptado os seus produtos para alternativas sem combustão, como o tabaco aquecido.
Sim, o principal é o produto. Tradicionalmente, a nossa empresa, e obviamente a Tabaqueira, é conhecida como uma empresa de cigarros. Compreender que estamos a vender um produto que tem um impacto negativo na saúde e entender que a sustentabilidade é sobre ser honesto em relação aos impactos negativos que se tem na sociedade é o primeiro passo.
Quisemos investir e criar um modelo de negócio que não baseie o nosso sucesso em fabricar ou vender cigarros. Isso significa transformar radicalmente o nosso negócio.
Também é importante ter a certeza de que esse produto é vendido às pessoas certas. Temos de ter programas e políticas que nos permitam alcançar os fumadores, para que eles possam mudar, e não os jovens ou os não-fumadores.
Então, e depois de consumido, para onde é que o produto vai? Todos os produtos deixam um rasto e um impacto no ambiente. Entender qual é o impacto que o produto cria, permite desenvolver produtos melhores. Desenhar a pensar na sustentabilidade, criar a pensar na circularidade e garantir que o fim da vida dos nossos produtos é adequado, para que não acabem no campo ou nas ruas.
Criar toda essa consciência permite-nos operar de uma forma mais responsável e mais sustentável.
Mas todas essas mudanças representam investimentos avultados. Como é que pequenas e médias empresas, que representam a maior parte do tecido empresarial português, se podem adaptar?
O custo está sempre lá, o que acontece é que muitas vezes é externalizado e o ambiente está a pagar por isso. Por exemplo, se eu tenho um pequeno ou grande negócio e não estou a prestar atenção para onde vão os resíduos, eles acabam por poluir a água. É muito caro prevenir isso e manter a água limpa. Se não estiver a pensar nisso, não tenho esse custo, mas o ambiente está a pagá-lo. A sociedade, que não pode aproveitar essa água, está a pagar esse custo. Os animais que vivem lá, estão a pagar esse custo.
Acho que é uma questão de mudar de mindset. Quando se tem uma empresa pequena, média ou grande, e se leva em conta o que é preciso para criar um negócio responsável, há certas barreiras que não se podem ultrapassar.
Acho que reagir é sempre mais caro do que prevenir. Ao criar uma empresa é preciso incluir a sustentabilidade como parte do negócio, tal como produtos, serviços ou pagar salários.
Enquanto sociedade não podemos continuar a poluir o ambiente, destruir a biodiversidade, gerar emissões de CO2, e esperar que o problema desapareça.
Essa mudança de mindset começa nas lideranças. Qual diria que é o maior desafio para os líderes atuais?
Acho que tem sempre a ver intencionalidade. Quando há vontade, arranja-se sempre forma. E quando se quer efetivamente mudar, é preciso ter noção de que leva tempo. Não é sobre o quão rápido acontece, mas sobre o que está a acontecer no momento, o que se pode medir, é sobre comparar o progresso de forma transparente para saber que caminho seguir.
Quais são as suas principais recomendações para que as empresas portuguesas sejam maiores e mais sustentáveis em 2043, ano em que Portugal celebra os 900 anos de existência?
Desejo muita prosperidade e que, em 2043, Portugal seja ainda melhor do que é hoje. Para isso, acho que o setor privado vai desempenhar um papel muito importante. É importante que não pensemos apenas a curto prazo e realmente façamos planos para o futuro. Isso significa garantir que os recursos naturais que temos neste país, que não são infinitos, sejam preservados e utilizados de uma forma consciente; que a população que está aqui tenha qualidade de vida e prosperidade. Acredito que, quando trabalhamos juntos para um objetivo comum, o país torna-se sempre melhor.
Portugal também tem muito a ensinar ao mundo. Há muito a aprender com a abertura deste país e a sua consciência de preservar os ecossistemas naturais. Acho que a Europa, em geral, está sempre à frente quando se trata de sustentabilidade. Portugal é parte da Europa e acho está a fazer um bom trabalho de liderança em sustentabilidade.
diana.gomes@newsplex.pt