A Batalha de Aljubarrota, ocorrida a 14 de agosto de 1385 no planalto de São Jorge, foi um dos eventos mais decisivos da história de Portugal. Sem essa vitória, o reino português provavelmente teria sido absorvido por Castela, perdendo a sua independência. A vitória não apenas consolidou a Segunda Dinastia portuguesa, com D. João I, mas também abriu caminho para a era dos Descobrimentos, a fase mais brilhante da história nacional. Aljubarrota moldou, direta e indiretamente, o futuro de Portugal e teve um impacto duradouro na história global.
639 anos após a Batalha de Aljubarrota, o que devem aprender os líderes de hoje sobre este feito histórico? A vitória deve-se essencialmente à forma destemida como Nuno Álvares Pereira guiou os seus homens? À inovação do famoso “quadrado português” que aprendemos na escola? Pura sorte? Ou, por outro lado, deveu-se a um excelente planeamento e a uma brilhante execução, a partir das melhores práticas do final da época medieval?
A Batalha Real
A Batalha de Aljubarrota começou com o exército português, liderado por D. João I e estrategicamente posicionado por Nuno Álvares Pereira, ocupando uma posição defensiva vantajosa. Os castelhanos, ao chegarem, tentaram contornar essa posição, levando os portugueses a inverterem a sua formação para enfrentar o inimigo de frente. O ataque inicial da vanguarda castelhana, composta em grande parte por tropas francesas, foi repelido pelas fortificações preparadas pelos portugueses.
À medida que o combate avançava, o exército castelhano, inicialmente a cavalo, foi forçado a lutar a pé devido às defesas e ao terreno adverso. Sob constante ataque de flechas e virotões dos arqueiros ingleses e besteiros portugueses, as tropas castelhanas enfrentaram dificuldades significativas. A tentativa das alas castelhanas de flanquear os portugueses teve pouco sucesso dado que o campo de batalha estreito dificultou qualquer movimento eficaz.
O pânico tomou conta do exército castelhano quando a bandeira do seu rei foi derrubada, levando a uma fuga desorganizada e ao espezinhamento de todos quantos caiam nas covas. As baixas foram pesadas para os castelhanos, com milhares de mortos, enquanto as perdas portuguesas foram relativamente menores. O rei castelhano, D Juan I, foi forçado a fugir várias dezenas de quilómetros para Santarém para salvar a vida. A vitória consolidou a posição de D. João I e teve um impacto duradouro, com Castela em luto por ano e meio devido à derrota devastadora.
Excelente planeamento e brilhante execução
A Batalha de Aljubarrota foi marcada por um excelente planeamento por parte dos portugueses. A vitória obtida contra um exército castelhano numericamente superior não foi fruto do acaso, mas resultado de uma série de decisões estratégicas e táticas meticulosamente pensadas e melhor executadas. Transpostas para os dias de hoje, convertem-se em relevantes lições de liderança na política, nos negócios, na diplomacia.
Nuno Álvares Pereira selecionou cuidadosamente o planalto de São Jorge como campo de batalha, tendo visitado detalhadamente o local (pelo menos) no dia anterior. Este local oferecia vantagens significativas, como terreno elevado e estreito, que limitava os movimentos da numerosa cavalaria castelhana e facilitava a defesa. A presença de declives e outras características geográficas dificultava ataques frontais e flanqueamentos por parte do inimigo.
Lição de liderança: Escolher o “campo de batalha” de forma proactiva. Seja em negócios, política ou outro campo, identificar e posicionar-se estrategicamente em situações onde as suas vantagens possam ser maximizadas é crucial para o sucesso.
Antecipando o confronto, as forças portuguesas construíram fortificações temporárias, como abatises (empilhamento de troncos), fossos e covas de lobo. Estes obstáculos serviram para desacelerar e desorganizar o avanço castelhano, neutralizando a eficácia da sua cavalaria pesada. Essas fortificações foram uma surpresa para os castelhanos, que não esperavam enfrentar tais defesas, forçando-os a desmontar e avançar a pé em condições desfavoráveis.
Lição de liderança: Planear surpresas. Em qualquer área, introduzir inovações ou estratégias inesperadas pode desestabilizar a concorrência e criar vantagens decisivas.
Nuno Álvares Pereira tinha um Plano B, o que pode ser visto na flexibilidade demonstrada pelos portugueses quando os castelhanos tentaram contornar a posição inicial, movendo-se para o Chão da Feira (a Sul da posição portuguesa). O Condestável e o Rei rapidamente ajustaram as suas posições, rodando o exército 180º para manter uma linha de frente forte contra os castelhanos. Essa capacidade de adaptação rápida demonstra que os líderes portugueses estavam preparados para esta eventualidade.
Lição de liderança: Ter sempre um plano B (mesmo quando o Plano C é a morte). No mundo atual, onde as circunstâncias mudam rapidamente, a capacidade de adaptar e ajustar os planos conforme as novas realidades surgem é essencial para a liderança eficaz.
A formação em quadrado defensivo (vanguarda forte, duas alas avançadas, mas que podem retroceder facilmente, retaguarda poderosa e pronta a intervir) utilizada pelas forças portuguesas não era uma invenção nova, mas sim uma adaptação de táticas defensivas que já existiam, como as usadas por exércitos medievais (por exemplo, na Guerra dos Cem Anos) e até mesmo na antiguidade. A inovação aqui foi a forma como essa tática foi melhorada e aplicada ao contexto específico da batalha, levando em conta o terreno, o tamanho das forças, e a composição do exército inimigo.
Lição de liderança: Capitalizar nas melhores práticas. Os líderes contemporâneos devem ser capazes de identificar e adaptar as melhores práticas já existentes às necessidades e contextos específicos da sua organização ou situação, aprimorando-as para alcançar melhores resultados.
As tropas portuguesas, embora menores em número, demonstraram uma excelente coordenação entre as diferentes unidades, como a cavalaria, infantaria e arqueiros/besteiros. A disciplina na manutenção das formações defensivas e a eficácia na resposta aos ataques castelhanos foram decisivas. A capacidade de manter a formação e resistir ao impacto inicial da cavalaria inimiga foi um exemplo claro de superior execução.
Lição de liderança: Ser eficiente na coordenação e delegação. No contexto moderno, a capacidade de coordenar e delegar eficientemente as tarefas entre diferentes equipas é fundamental para garantir que todos trabalham em harmonia, maximizando a eficácia da organização.
A execução do plano também dependia da liderança de D. João I e Nuno Álvares Pereira, que souberam manter o moral elevado entre as suas tropas. A sua presença na linha de frente e a forma como conduziram o combate foram fundamentais para manter a coesão e a eficácia das forças portuguesas.
Lição de liderança: “Lead from the front”. Nos dias de hoje, os líderes que se envolvem diretamente, demonstram coragem e tomam a iniciativa são mais capazes de inspirar e manter o moral elevado das suas equipes, promovendo coesão e eficácia.
Epílogo
O sucesso português em Aljubarrota não foi apenas resultado de bravura ou sorte, mas de um planeamento meticuloso e uma execução estratégica superior. As lições de Aljubarrota são aplicáveis não apenas em contextos militares, mas também em outras áreas como a gestão, a política e o empreendedorismo.
Sócio da Egon Zehnder (Portugal)