A urgência da sustentabilidade no séc. XXI

É vital construir uma nova perspetiva para lidar com a urgência da sustentabilidade.

Quando, em 1991, Michael Porter formulou a hipótese que ganhou o seu nome, o mundo da economia e dos negócios, e o da política, ouviram-na com estranheza. O economista da Harvard Business School afirmava que uma regulamentação ambiental rigorosa podia induzir eficiência e impulsionar inovação com consequências na melhoria da competitividade comercial.
Dito de outra forma, a preservação do ambiente e a saúde económica das organizações e, por consequência, dos países podiam ser conceitos alinhados e não antagónicos, como assumia até então a maioria das políticas económicas.
Em 1968 , o ecologista Garrett Hardin apresentou-nos a tragédia dos comuns, referindo-se a uma situação em que indivíduos com acesso a um recurso público (também denominado comum) agem no seu próprio interesse e, ao fazê-lo, acabam por esgotá-lo. Em certa medida, Porter concretiza este conceito, com a necessidade de políticas públicas que regulem o uso de recursos, apontando a inovação como estratégia.
Mais de 30 anos depois, a hipótese Porter é confirmada todos os dias. Políticas públicas de preservação do ambiente têm avançado em muitos países do mundo, embora a passos distintos. A dependência da humanidade da qualidade dos recursos do Planeta, que a ciência ilustra diariamente, e consumidores mais informados têm sido essenciais para a convergência da qualidade do ambiente e do desenvolvimento dos países. Certo? Mais ou menos!
Impulsionado pela agenda pública das alterações climáticas, aliás imposta pela realidade com records sucessivos de temperaturas elevadas, secas extremas, inundações gigantescas e incêndios incontroláveis, o uso dos termos sustentabilidade e sustentável integram praticamente todos os contextos sociais, por vezes de forma obsessiva. Propósitos de políticas públicas, missão e valores das organizações, critérios de financiamento, publicidade de bens de consumo, discursos de políticos e figuras públicas, tudo alinha pela sustentabilidade. A sustentabilidade parece ser tudo, em todo o lado, ao mesmo tempo. Infelizmente, vários estudos mostram e denunciam o fenómeno greenwashing, de tal forma que a Comissão Europeia propôs recentemente a Diretiva Green Claims.
Em setembro passado , Johan Rockström, ecologista, mostrou-nos que seis das nove fronteiras planetárias, dentro das quais a humanidade poderia viver em segurança, tinham já sido transgredidas. A Terra está agora fora do espaço operacional seguro para a humanidade, no que diz respeito às alterações do sistema climático, biodiversidade, ciclos do fósforo e do azoto, alterações do uso do solo, disponibilidade de água doce e novos organismos. Por exemplo, teremos de viver num Planeta com uma temperatura média global superior a 1.5C à que existia antes da revolução industrial. Aqui chegados a 2023, admitamos que a propalada sustentabilidade tem muito de meras intenções ou propósitos mais ou menos duvidosos. Reconheçamos também que muito se tem conseguido, sobretudo na Europa! Mas é factual que é pouco, muito pouco a nível global, se queremos preservar condições de vida humana para todos neste Planeta!
Em pleno século XXI, as recentes notícias em Portugal têm sido dolorosas de compreender. Não me refiro à componente judicial, mas à constatação de que valores naturais protegidos, através de uma Zona Especial de Conservação (por ser um sítio de interesse comunitário no âmbito da Diretiva Aves e Diretiva Habitats), são tratados como um empecilho a remover para fazer avançar um projeto importante para a economia nacional. As políticas públicas e as agências para as implementar existem, mas a mentalidade de incumprimento também. Recuámos para o século passado, para antes de 1991!
O caso da ZEC na área de Sines é paradigmático como exemplo da tragédia dos comuns de Hardin, um contra-exemplo da hipótese de Porter e um fator que ajuda a explicar como já ultrapassámos a fronteira planetária de Rockström da biodiversidade.
É urgente construir uma nova perspetiva e um nível diferente de compreensão para se lidar com a urgência e a complexidade da sustentabilidade, neste artigo focada na componente ambiental. A ciência tem o conhecimento e as ferramentas necessárias para o fazer, basta aprender. Porém, continuamos a moldar mentalidades e a formar profissionais especializados (e.g. engenheiros, médicos, juristas, políticos, economistas), sem os fundamentos sobre o funcionamento sistémico do Planeta e os impactos ambientais, económicos e sociais decorrentes da perda de capital natural e da alteração dos ciclos naturais.
Numa altura em que se reconhece a urgência da transição climática, é imperativo dar esta formação aos estudantes do ensino superior, em todas as áreas de formação.
Virtualmente, todos são chamados a contribuir e a decidir, enquanto profissionais, para a trajetória do País alinhada com a sustentabilidade do Planeta. Esta é uma responsabilidade das Universidades, dar o suporte para que Ambiente e Desenvolvimento sejam entendidos como valores compatíveis e virtuosos.
Só assim, haverá uma probabilidade razoável de, daqui a 20 anos, a sustentabilidade do Planeta ser um valor consistente, central e sistémico das decisões de políticos e de profissionais. Devemos isso às gerações que ainda não nasceram.

Pró-Reitora da Universidade Nova de Lisboa